Antigos moradores permanecem no Barreiro, distrito de Apucarana, que outrora concentrou movimentadas olarias, das quais originou o nome, que
lembra o barro pegajoso e vermelho
Um
domingo. Dia das Crianças e de Nossa Senhora Aparecida para os católicos. Fazia
22 anos que eu não ia para aquelas bandas. Saindo de Maringá, Mandaguari,
rodovia PR-444, Caixa de São Pedro, distrito de Apucarana, Fazenda Valéria e
chega-se a outro distrito de Apucarana, o Barreiro, onde acontecia uma
movimentada festa para a criançada, iniciativa da comunidade local.
Quando estive lá fotografei um senhor de
chapéu branco, que jogava truco. Indaguei sobre ele, e me informaram que se
tratava do seu Carlos, um antigo morador da localidade.
O
Barreiro, quando eu era menino e morava em Apucarana, o frequentava para jogar
bola no campo que ainda existe por lá. Me lembro do famoso advogado, o doutor
Cylleneo Pessoa Pereira, narrador de futebol da Rádio Guairacá de Mandaguari.
De vez em quando, ele e o saudoso radialista Airton Costa, numa carroceria de
caminhão, narravam jogos do Barreiro contra visitantes, que jogavam no
distrito.
Lembro
também do Miguelzinho, exímio jogador do Barreiro, que tinha um potente chute.
Terror dos goleiros. Mas voltando ao seu Carlos. Encontrei-o novamente. Carlos
Ianisk nasceu em 5 de julho de 1928, em Canoinhas (SC) e chegou a Apucarana em
1951. A família foi morar no Barreiro, e ele trabalhar numa granja de frangos e
galinhas.
Carlos
é viúvo, tem seis filhos e perdeu a conta de seus netos e bisnetos. Aposentado,
diz que foi poucas vezes ao médico e toma apenas um comprimido para controlar a pressão. Fuma um cigarrinho de palha mesclado com um de
filtro, toma umas cervejinhas de lata, chimarrão. “Não sinto nada, viu, rapaz”,
comemora. Dos velhos tempos do Barreiro, ele se lembra da abundância de peixe
que havia nos rios. “Bagre, lambari, cascudo, a gente pescava demais”, conta. No
local, havia três olarias, daí o nome do distrito.
Antônio
João da Silva, um sul-mato-grossense nascido em 10 de maio de 1943. De uma
família de 13 irmãos, ele morou em Santa Catarina e carrega o apelido de
Catarina. É uma espécie de coordenador da Igreja Católica local (a capela do
Barreiro), em cujo interior há um painel com fotos e outros objetos que revelam
as várias fases do distrito desde a década de 50.
No
começo, a vida não era fácil. Catarina e a família se alimentavam de peixe,
derivados de milho, almeirão branco que nascia a esmo no meio da roça e até
macaco. “A gente tinha de se virar porque não havia fartura de comida como
hoje”, recorda.
Se
alguém ficasse doente recorria aos chás de plantas medicinais e às benzedeiras.
“Mesmo na cidade, não havia médicos, havia farmacêuticos, mas nem sempre era
possível chegar lá por causa das precárias estradas e falta de condução”, diz. O
bom eram as festas que existiam no distrito reunindo milhares de pessoas, com
churrasco, bebidas e guloseimas.
Mas
logo as coisas evoluíram. Hoje, pelo menos 70 famílias moram no Barreiro. Os
que não dispõem de propriedades rurais trabalham na cidade ou são aposentados.
“Evidente que as coisas melhoraram, mas a modernidade trouxe outros problemas”,
afirma Catarina. “Por exemplo, os furtos em residências e o consumo de droga”.
Mesmo assim, o Barreiro é um oásis de
tranquilidade. Não é difícil ver morador sentado na porta de casa proseando com
o vizinho. Galinhas, patos, porcos, cachorros e gatos pelas ruelas de terra.
Nas lagoas artificiais, garças, saracuras e marrecos selvagens. Voltarei. Não
daqui a 22 anos, mas logo, para tomar umas com o seu Carlos lá no Barzinho, à
beira da estrada.
A SEGUIR:
Antigo bar do Barreiro, na beira da estrada, que corta o distrito
Seu Carlos, uma espécie de patrimônio da comunidade
Comunidade reunida faz a festa para as crianças, no Dia das Crianças, em 2018
Cristo no interior da Igreja do Barreiro
Catarina e seu inseparável Fusca, no Barreiro