Estabelecimento idealizado e
construído por Américo Dias Ferraz, segundo prefeito de Maringá, na Avenida
Getúlio Vargas, era sofisticado para a época e se tornou um dos pontos de
encontro da alta sociedade maringaense, ao lado do Grande Hotel e da sede
social do Aeroclube
(Texto: Airton
Donizete; fotos: Divulgação e AD)
Idos
de 1954. O bate papo na calçada seguia animado. Falavam de tudo um pouco. Das intrigas que envolviam o governo Vargas.
Dos discursos inflamados de Lacerda. Da Copa do Mundo na Suíça. A proeza da
máquina húngara enchia os olhos, mas o título ficou com a álgida Alemanha
Ocidental. No plano local, o assunto era a contenta entre o prefeito Villanova
e a Companhia Melhoramentos. A cobrança de IPTU colocou-os em rota de colisão.
Na
parte interna rolava a música ambiente, que se completava com a imagem de um
aquário de peixes coloridos e belas poltronas. Quem chegasse por ali e não
quisesse sentar às mesas, poderia usufruir das poltronas. Não faltavam
políticos, advogados, dentistas, jornalistas, radialistas, cerealistas e
corretores de imóveis. Um ponto de encontros. Um deles ocorreu entre José
Sanches Filho, 79, e João Batista Francotti. Ao saborearem um cafezinho,
Francotti o convidou para vender publicidade para a Rádio Cultura. Ele aceitou.
Nascia ali o primeiro publicitário de Maringá.
O
aposentado Dioraci Martins, 76, chegou a Maringá em 1958. Ele diz que admirava a
fila de carros que se formava à frente do Bar Colúmbia. Sinca Chambord,
Aeroilis, Karmann Ghia, Lambreta, Vemaguet. “O pessoal que tinha melhor poder
aquisitivo se reunia ali”, recorda, acrescentando: “De vez em quando, saiam uns
tiros”. A chamada “Pedra”, onde ficavam os vendedores de carro, funcionava na
Avenida Getúlio Vargas. “Um ou outro negócio mal resolvido resultava em briga”.
Do outro lado, a Panificador
Copacabana
A
Avenida Getúlio Vargas, que se chamara Avenida Ipiranga, já era movimentada.
Pedestres iam e vinham em meio à baixa vegetação, que crescia no meio da via. Em
frente ao Bar Colúmbia, ficava a Panificadora Copacabana. De manhã, lotava. A
disputa era pelo pão quentinho. Mas se tivesse frio, compravam do mesmo jeito.
Do
outro lado da avenida, o toddy com leite e o cafezinho disputavam quem seria a
vedete no balcão. Entre as cadeiras e mesas espalhadas pelo salão, quase sempre
estava o publicitário Sanches. “Nunca vi nada igual”, diz ele, que chegou a
Maringá em 1953, ano em que o Bar Colúmbia foi inaugurado. “Havia um balcão de
mais de 15 metros e vários garçons engravatados”.
O
então rapazinho Luiz Augusto Leandro, conhecido dom Lulo, gostava de admirar o “Painel
do Café”, que ficava lá no fundo. Uma imponente obra de azulejos, produzida
pelo artista plástico Waldemar Moral. Comprador de café, o prefeito Américo
Dias Ferraz (1956/1960) encomendou-a ao artista paulista.
Mas
o próprio Colúmbia era uma obra de arte, que nascera da paixão de Américo pelo
café. “Era um dos meus bares preferidos, onde eu me juntava à moçada para um
papo”, afirma Leandro, cuja família chegou a Maringá na década de 1940. Aos 70
anos, ele continua encontrando os amigos nos botecos de Maringá.
Vendedor de bananas e
galinhas
Américo
carregava a pecha de figura excêntrica e folclórica. O jornalista Jorge
Fregadolli diz que ele mal assinava o nome. “Fazia um rabisco nos documentos da
Prefeitura, que passava por assinatura”, lembra. Pobre, quando chegou à cidade,
vendia bananas numa cesta e galinhas presas em uma vara. Dizem que no começo
andava até descalço pelas ruas de terra da recém-nascida Maringá. Mas era um
sujeito de tino e inteligência, tanto que se aprumou na vida e venceu as eleições
contra a nata maringaense.
Ele
carrega fama de ter sido o maior comprador de café do Brasil. Faz sentido
porque, na época, o País liderava a produção do grão. No Maringá Velho, ele
tinha a Cafeeira Santa Luzia. O painel do Bar Colúmbia era uma homenagem ao
ouro verde do Paraná. Mas Américo não esqueceu sua querida Guiricema, nos
rincões de Minas Gerais. No fundo do conjunto de azulejos, estão as montanhas,
que representam as terras mineiras.
Doce às crianças
Dizem
que o Bar Colúmbia, que foi vendido e durou até 1959, era um dos bares mais badalados
do Paraná. O saudoso escritor Osvaldo Reis contava que era criança e mal se
lembrava do local. Mas de vez quando um parente o levava lá para ganhar doce do
Américo, que presenteava com guloseimas as crianças que ficavam na frente do
bar. “Nunca entrei lá, mas me recordo que era tudo branquinho e muito chique”,
disse Reis.
E
bota chique nisso. Modernas choperias e garçons de gravatinhas borboletas. O
aposentado Léo de Paula, 74, conta que o Colúmbia tinha quatro setores:
Bomboniere, lanches e suco, bebidas e restaurante. “Tudo muito organizado”, diz. Aos domingos, havia matinês dançantes, com
início às três da tarde, como se dizia. A alta sociedade se reunia para dançar
e bebericar.
Bastidores políticos
O
publicitário Sanches não fazia uma parada tão longa no Colúmbia. Ele gostava
mesmo era dos botecos da periferia. Neles buscava inspiração e jargões para sua
publicidade, que só crescia impulsionada pela audiência da Rádio Cultura. “Mas no bar do Américo eu ficava sabendo o que
se passava nos bastidores políticos”, diz. “Quase tudo que acontecia na cidade,
era comentado ali”.
Entre
as hipóteses que levaram Américo a construí-lo está uma espécie de vingança
contra a elite da cidade. A turma que participava de eventos no Bar do Grande
Hotel e na sede social do Aeroclube. Mais tarde ocorreu algo que poderia
confirmar tal suposição. Em 1957, ele não foi aceito no quadro de sócios do
Maringá Clube e, com amigos, fundou o Country Clube de Maringá, em 1958.
Seja
como for, o que vale é que Américo ficou na história. Não apenas como prefeito,
mas como um personagem de Maringá. O comprador de café, que tinha um bar. Não
um bar qualquer. O Colúmbia. Na época, um dos mais badalados do Paraná.
PAINEL SERÁ REINSTALADO
As famílias Maimone
e Bruder doaram o “Painel do Café”, instalado no Bar Colúmbia, para o município
de Maringá. Construído em 1956, a obra representa uma cena de colheita de café.
O painel de azulejos mede 2,4 de altura (16 azulejos) por 7,95 de largura (53
azulejos). São 848 peças de 15 x 15 centímetros. Elas são donas do prédio, na
Avenida Getúlio Vargas, onde funcionava o bar do Américo e está o painel; hoje
há uma loja no local.
Para Nelson Maimone,
a doação é a concretização de um sonho. “Temos certeza que essa obra de arte
estará num local bem visível para que uma maior quantidade de pessoas possa
usufruir desse patrimônio de Maringá”.
Segundo Ulisses
Bruder, sua família está honrada e agradecida pela Prefeitura realizar o trabalho
de transferência da obra para um local apropriado. “Esperamos que a remoção e a
exposição seja realizada o mais rápido possível para a preservação da obra”.
A Prefeitura contratou um especialista, que retirou o painel do local e o restaurou. Deve ser colocado em um local em que possa ser apreciado pelos visitantes.
A LEI QUE AUTORIZOU O TOMBAMENTO
Autorizado pela lei nº 3478/1993, do então
vereador Oscar Batista de Oliveira, 67, (PMDB), o tombamento do “Painel do Café”
ocorreu pelo decreto nº 220/2011. Oliveira não chegou a frequentar o Bar
Columbia, mas se recorda do estabelecimento. “Eu não saía de lá da frente com
minha caixa de engraxate”, conta. “Naquele tempo, parte do movimento de Maringá
se concentrava na Avenida Getúlio Vargas, que em parte se devia ao bar do
Américo”.
Acompanhado da reportagem, ele esteve no local onde está o
painel. Para o ex-vereador, Maringá deveria preservar mais seus bens culturais.
“É nossa memória que vai ficar para as futuras gerações”, diz. “Se a gente não
cuidar, não vai sobrar nada”.
João Laércio Lopes Leal, 49, historiador da
Gerência de Patrimônio Histórico de Maringá, diz que retirar o painel do local
e instalá-lo em lugar que possa ser visitado e visto por mais pessoas, estimula
a conservação da memória de Maringá. “Esse painel retrata um importante momento
para o município, que é o ciclo do café”, afirma.
FOTOS (sequência)
O
famoso “Painel do Café” do Bar Columbia, que espera remoção